Forças elétricas 1 — Lei de Coulomb
(Método estático - caso das repulsões)
Influência da eletrização - Noção de carga elétrica
A 'eletrização' que pode ser obtida e exibida por certos corpos é um fato experimental incontestável. Avalia-se a eletrização de um corpo pelas ações mecânicas que ele desperta sobre outro corpo também eletrizado.
Diremos, pois, que dois corpos idênticos A e A’, de dimensões muito reduzidas, estão igualmente eletrizados (também se diz 'carregados') quando possuem quantidades de cargas elétricas iguais. Essa igualdade de quantidade de carga de A e A' se constata verificando se aplicam a mesma ação elétrica (força) sobre um terceiro corpo muito pequeno B, também eletrizado, colocado separadamente, à mesma distância (r) de A e de A'. Do mesmo modo se verificará que a quantidade de carga de A é 'n' vezes maior que a de A', se a ação elétrica de A sobre B for 'n' vezes maior que aquela de A' sobre B, sempre mantendo a mesma distância (r) entre os corpos.
Forças elétricas
Assim, as experiências fundamentais da eletrostática estabelecem que dois corpos eletrizados com cargas elétricas de mesmo sinal se repelem e que dois corpos eletrizados com cargas de sinais contrários se atraem; mostram ainda que as intensidades dessas forças de atração ou de repulsão variam com a quantidade de carga de cada corpo e com a distâncias que os separa.
Consideremos, pois, duas cargas elétricas puntiformes q e q', que suporemos de mesmo sinal e colocadas em dois pontos A e A' separados pela distância r.
Constata-se que: q' aplica sobre q uma força repulsiva f proporcional a q'; q aplica sobre q' uma força repulsiva f', proporcional a q. Em virtude do princípio da igualdade da ação e reação, essas duas forças devem ter intensidades iguais e serem diretamente opostas; vale dizer, têm a mesma linha de ação AA' e a mesma intensidade proporcional a q e q', de sorte que se pode escrever:
| f | = | f' | = f = qq' x j(r)
Influência da distância - Lei de Coulomb
Coulomb estabeleceu experimentalmente, em 1785, a seguinte lei, versando sobre o modo como varia a intensidade da força elétrica que se manifesta entre duas cargas elétricas, quando se faz variar a distância entre elas. Essa lei se enuncia:
A intensidade da força repulsiva ou atrativa que uma carga elétrica aplica sobre outra é inversamente proporcional ao quadrado da distância que as separa. Formalmente: f = constante x qq'/r2 .
Como eram muito reduzidas as intensidades das forças trabalhadas por Coulomb, para estabelecer a lei do inverso do quadrado da distância, suas medições foram realizadas mediante dois métodos particularmente sensíveis:
--- um método estático, o da balança de torção, que Coulomb aplicou especialmente ao estudo das forças repulsivas;
--- um método dinâmico, o do pêndulo elétrico, que Coulomb empregou no estudo das forças atrativas.
Balança de torção - Descrição
A balança de torção permite equilibrar a força repulsiva que se manifesta entre duas "bolas de sabugueiro" pela torção de um fio de prata.
Compõe-se o aparelho de uma caixa cilíndrica de vidro, que repousa sobre um prato sustentado, por sua vez, por parafusos niveladores. A caixa pode ser fechada em sua parte superior por um prato de vidro, no centro do qual se fixou um tubo de vidro T e que apresenta, perto da borda, uma abertura que permite introduzir na caixa uma 'bola de sabugueiro A, suspensa numa haste isolante. A parte superior do tubo T possui uma guarnição metálica, na qual pode girar um cilindro graduado M, que constitui o micrômetro de torção.
Nesse cilindro pode igualmente girar, com reduzido atrito, um segundo cilindro C de eixo idêntico, munido de um índice I e de uma pinça na qual se acha fixada a parte superior do fio de torção F. A parte inferior do fio de torção está apertada numa segunda pinça que suporta uma agulha isolante horizontal, terminada numa das extremidades por uma pequena 'bola de sabugueiro' B, e na outra extremidade por um pequeno plano de papel B’, impregnado de essência de terebentina, servindo de contrapeso à bola B e amortecendo as oscilações da agulha.
Esta pode girar diante de uma graduação de 0 a 360o, inscrita em uma fita de papel colada na caixa de vidro: pode-se, assim, medir o ângulo produzido com a torção do fio F, quando as bolas A e B recebem eletrizações do mesmo sinal e se afastam.
Leis da torção
Quando a equipagem móvel (CFBB') é abandonada a si própria, a agulha horizontal suspensa no fio F se orienta numa direção bem determinada. Se a afastarmos de sua posição de equilíbrio num ângulo q, o fio de suspensão sofre uma torção, e as reações elásticas de restituição desenvolvidas no fio por essa deformação tendem a reconduzir a agulha para sua posição de equilíbrio. A experiência (resistência dos materiais) mostra que, para mantê-la na direção que forma ângulo q com a posição de equilíbrio, devemos aplicar um par, de momento C.q, proporcional ao ângulo de torção q. As reações elásticas originadas pela torção do fio e que equilibram esse par são, pois, também equivalentes a um par, de momento C.q.
C.q denomina-se par de torção (ou, conjugado de torção); C é a 'constante de torção' característica do fio, que depende de seu comprimento L, de seu diâmetro d e de sua natureza. Coulomb, que estabeleceu as leis da torção antes da lei elementar das ações elétricas, mostrou que se podia escrever:
C = k.d4/L
onde k é um coeficiente que depende da natureza do fio.
Com fios de natureza conveniente, suficientemente longos e finos, as reações de restituição elásticas desenvolvidas pela torção podem tornar-se suficientemente fracas para equilibrar forças de intensidade muito pequena; a torção permite, assim, medir forças de intensidades extremamente reduzidas.
Descrição das experiências com a balança de torção
Para verificar a lei elementar das ações elétricas, convém regular preliminarmente a balança. Para esse fim, gira-se o botão C de maneira que faça o índice I coincidir com o zero do micrômetro; gira-se em seguida o micrômetro na guarnição metálica do tubo T, de maneira que ponha a bola móvel B em contacto com a esfera fixa A; gira-se finalmente o disco de vidro que fecha a caixa, até que o sistema das duas esferas em contacto fique diante do zero da caixa.
Tocam-se, então, as duas esferas A e B, com uma pequena esfera eletrizada; ambas adquirem eletrizações do mesmo sinal, e a bola B é repelida pela esfera fixa A, à distância angular a; Coulomb achou a = 36o. Gira-se em seguida o índice I de um ângulo b, num sentido tal que a torção seja aumentada e B se aproxime de A. Quando as distâncias das duas esferas se tornam a/2, a torção do fio é b + a/2 .
Coulomb achou b + a/2 = 144o = 36o x 4, isto conduz a, b = 144o - a/2 = 144o - 18o = 126o.
Gira-se finalmente I do ângulo b' a partir de sua posição inicial, de maneira que a distância angular das duas esferas se torne igual a a/4.
Coulomb constatou que a torção total era muito aproximada de 36o x 16 = 576o (de acordo com o original de Coulomb, 575o 30' em vez de 576o), o que dá b' = 576o - 9o = 567o .
Como o par de torção que equilibra a força elétrica é proporcional ao ângulo de torção, a força elétrica é também proporcional a esse ângulo. Pode-se, portanto, armar o seguinte quadro de distâncias versus forças:
Distâncias | 36o | 18o | 9o |
Forças | 36o | 144o=36ox4 | 576o=36ox16 |
Quando a distância se torna 2, depois 4 vezes menor, a intensidade da força se torna 4, e em seguida 16 vezes maior, o que verifica a lei.
Cálculo exato da experiência
Na realidade, o afastamento das duas esferas não é medido por sua distância angular, e o braço de alavanca, na extremidade da qual se exerce a força elétrica, não é o semicomprimento da haste que suporta a esfera B, como implicitamente o supusemos.
Representemos em projeção horizontal a esfera fixa A, a alavanca móvel e a esfera B, o fio de torção e o índice I.
isto é, o ângulo de torção varia na razão inversa do quadrado da distância angular entre as duas bolas. Ora, é precisamente isso que resulta das experiências de Coulomb.
Aplicação da torção à medida de intensidades de forças
Como observamos acima
a qual, com os dados experimentais, permite obter intensidade de força.
Suponhamos esses dados: a + b = 1 radiano; l.cos(a/2) = 10 cm; L = 50 cm; d = 0,1 mm = 0,02 cm; mantendo-me no sistema CGS, encontrei para a prata (fio de prata) k = 2,7.1010 uCGS. Obteremos, ainda no CGS, F = 0,54 dinas [se preferir esse resultado em 'newtons', basta lembrar que 1 dina = 10-5 N, logo, F = 0,54.10-5 N].
Se o fio tivesse um diâmetro 10 vezes menor (0,01 mm = 10 µm), o mesmo ângulo de torção de 1 radiano corresponderia a uma força 10 000 vezes menor. A intensidade de força posta em jogo na primeira experiência de Coulomb não ultrapassava 0,02 dina; e utilizando-se fios de quartzo em vez de fios de prata, conseguiu-se medir intensidades de forças de 10-8 dinas (10-3 N).
Vê-se, assim, a extrema sensibilidade do método do dinamômetro de torção, que permite medir intensidades de forças de origens bem diversas: elétricas, magnéticas, de gravitação, de pressão, de radiação, etc.